A INFLUÊNCIA DE MATO GROSSO NA LITERATURA BRASILEIRA

Narrava singelamente, de tal maneira, porém, que os sabedores lhe acatariam as afirmativas a começar de Toledo de Lara, a mais alta autoridade judicial, que endossou, com a própria assinatura, a transcrição, valorizada com as suas anotações marginais. A sua crônica, além de oficializada, no limiar do livro, que deveria, ano por ano, receber os acrescentamentos de futuros vereadores, ainda naturalmente andaria em mãos dos estudiosos, que lhe multiplicaram as cópias, uma das quais veio a lume nos Anais da Biblioteca Nacional.
Desde então, indispensável se tornou a sua consulta a quem pretendesse conhecer as peripécias do povoamento de Cuiabá, e, portanto, de Mato Grosso.
Assim, Capistrano de Abreu, autoridade insigne, especialmente na história do período colonial, refere pormenores, que lhe denunciam a leitura meticulosa de Barboza se Sá.
Outros lhe seguiriam o exemplo, embora nem sempre declarassem a fonte informativa, que se franqueou, ao uso dos doutos.
Ao continuador da crônica barbozeana, Joaquim da Costa Siqueira, diverso ambiente se deparou, mais equilibrado em sua economia e trato social, que permitiria a quinzena festiva de agosto de 90 (1790) em homenagem ao Ouvidor bem quisto.
Cavalhadas e contradanças, de que participaram galãs “vestidos à maruja”, alternaram-se com representações de comédias, óperas e tragédias, em que o elemento feminino, tradicionalmente mantido na reclusão do lar, era substituído por figurantes masculinos.
Aspasia na Syria - Irene - Saloio Cidadão - Zenóbia no Oriente - D. Inez de Castro - Amor e Obrigação - Zaira - O Tutor Enamorado - Ésio em Roma, entre várias peças teatrais, evidenciaram a vocação artística dos admiradores do magistrado, transfigurados em lances trágicos ou cômicos.
E também a convivência de individualidades inclinadas ao cultivo das letras, que em breve prazo logravam improvisar apreciável espetáculo de amadores, gabado por Lara, depois que, transferido para São Paulo, já não necessitava dissimular as verdadeiras impressões causadas pelos seus jurisdiscionados da ouvidoria mato-grossense.
Exaltou, a propósito, a “habilidade dos filhos de Cuiabá, o gosto com que se empenham e a eficácia dos seus ensaiadores.” (sem indicação de fonte)
A vila sertaneja diligenciava compensar o primado administrativo, em que preterida pela finalidade política da Vila Bela, por maior dedicação aos problemas culturais, que lhe constituiria a mais interessante característica em qualquer época.
Escassa, embora, de meios, à distância dos centros civilizados, jamais deixaria de cuidar da sua elevação intelectual, que maravilharia mais de um visitante ilustre.
Um destes, bretão de nascimento, companheiro de Bar- (p. 24) roso {Barroso} nas lutas platinas, tanto se enamorou de Cuiabá, aonde o levaram os seus afazeres de oficial da marinha imperial, que por lá se aprazia em ancorar, chumbado ao seu destino, antes que a barreira, oposta pelo seu nome à invasão triunfante, lhe galardoasse a abnegação de sexagenário brioso com as honras de Barão de Melgaço.
Na época, ninguém o igualou em devotamento à Província adotiva, a que serviu com a pena e a espada.
Contemporâneo de Vitor Hugo, serviu-lhe, de longe, a trajetória maravilhosa, bem como a de Lamartine, cujas obras lhe deleitavam as horas de leitura naquele desterro voluntário, em que se creditou a benemerência não já de Mato Grosso, como do Brasil inteiro.
Se não compôs nenhum poema, na prosa majestosa do seu conterrâneo Chateaubriand, deslumbrado diante dos panoramas americanos, que se lhe deparasses, soube transmitir as suas observações em monografias, que se tornaram fundamentais para o conhecimento da terra mato-grossense.
Quem não as tenha manuseado, não poderá avaliar a contribuição científica de Leverger, feito hidrográfico abalizado e historiador, para corrigir a descrição do território imenso, que palmilharia em grande extensão.
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