ASPECTOS DA LITERATURA DE MATO GROSSO
E desses que - ai de mim! Outrora aqui viveram
resta, pairando no ar, a alma triste e sozinha
das velhas casas cujos donos já morreram!
Como poeta, José de Mesquita publicou os maravilhosos livros Poesias,
terra do berço, e Da epopéia mato-grossense, como historiador
publica ainda pelo jornal A cruz os interessantes estudos que se (p.156) intitulam
Gentes e cousa de Antanho.
O contista já nos deu A Cavalhada e Espelho de Almas, ambos à
maneira encantadora que lembra a suavidade de Machado de Assis, Agripino Grieco,
em Vivos e Mortos, disse de Castro Alves: “que as suas poesias parecem
seres vivos.” Vejamos agora como esse dizer se ajusta à ‘A
Garça’ de José de Mesquita:
Pantanal Água e céus Solidão silenciosa
Num remigio, a cortar as aguadas serenas,
vai a garça a voar na tarde cor de rosa,
e da água escura à tona a asa lhe aflora apenas.
Passa e no limo abjeto e na vaza asquerosa
não se lhe mancha o alvor e a candidez das penas,
pois no vôo sutil desliza, donairosa,
sobre as águas de lodo e de impureza plenas.
Alma de poeta, sê qual a garça voando
sobre o vil atascal e sobre a lama impura,
olhos postos no azul, no éter sereno e brando...
Conserva teu ideal, tua ilusão querida,
e não turves jamais das asas a brancura
no sórdido Paul das torpezas da vida...
Após a leitura destes versos sentimos o dizer de Coelho Neto: “Por ela o meu sangue, toda minh’alma (p.157) para resguardá-la: é o meu amor, é o meu ídolo, é o meu ideal - a forma”.
Torce, aprimora, alteia, lima
A frase; e enfim,
No verso de ouro engasta a rima
Com um rubim.
Agora, Lamartine Mendes completa a trindade brilhante dos nossos parnasianos.
Há pouco, numa Antologia de Poetas Paulistas, lá deparei Lamartine
Mendes, entre Guilherme de Almeida e Paulo Setúbal. O fato no orgulha,
porque o seu berço foi esta Cidade Verde.
A Volta das Canoas, soneto de sua lavra, é um quadro diamantinense,
berço dos seus maiores e a pintura é viva e nós todos
a sentimos:
A Volta das Canoas
Quando a tarde se esvai, dourando a mata,
E na embaúba, às margens das lagoas
Gemem as rolas, descem as canoas,
Da água enrugando o espelho que as retrata
Vem da pesca. Um remeiro a voz desata,
E canta; e as ondas quebram-se nas proas.
E pelas ondas trëmulas e boas
Há reflexos de púrpura e de prata. (p.158)