A poesia mato-grossense na historiografia de Rubens de Mendonça.


São contundentes e sinceros os comentários do crítico que desde a primeira referência à poesia mato-grossense, na fase colonial, já aponta a pobreza de rima na poesia de José Zeferino Monteiro Mendonça. Sua obra revela-se pouco trabalhada tecnicamente e bastante laudatória, o que na visão do historiador é fato compreensível diante de uma época que tinha como modismo oferecer o poema aos “mandões da terra”.
Do aparecimento do primeiro poeta ao segundo, temos um século de intervalo, período do qual somos informados apenas da produção científica, expedições, anais e livros de história. O segundo poeta surge então já no Romantismo, Antônio Cláudio Soído. No comentário sobre o poema de Soído, Rubens de Mendonça situa-nos sobre as condições que levaram o poeta àquela produção, um poema dedicado à noiva Maria Justina da Gama, ao presenteá-la com uma quarta de carvão. Nesse caso, o historiador cumpre papel de crítico, na medida em que cria condições para que possamos entender o “tão escuro presente” citado no poema.
Outro aspecto do estilo de Rubens de Mendonça que sobressai no livro está voltado à concepção do poético que norteou o escritor e ao exercício poético inspirado na forma clássica do soneto. Lembramos novamente Barthes para afirmar que o estilo põe-se como necessidade ao escritor, mas é pela escrita que ele assume sua função social; é ela quem dita o valor e a destino social de sua obra. (2000, p. 13 -14).
O compromisso com a forma da escrita poética foi importante à literatura do Estado para que se pudesse exemplificar o valor dessa produção, com versos no mesmo nível de sonetistas famosos. Se no Romantismo oficial, por exemplo, o “gênero entre todos contemplado foi o romance” (Bosi, 1989, p. 106) que, com uma linguagem mais espontânea, conseguiu atender ao apetite romanesco de massas de jovens leitores e leitoras; no Romantismo mato-grossense predominou a poesia, com a preocupação estética cristalizada na preferência pela forma clássica do soneto.
Da poesia romântica, Rubens de Mendonça passa para a prosa. Interessante que nesse capítulo destinado à prosa, o historiador irá tratar também da produção popular, com o título Os troveiros do sertão. O crítico cita as quadras com suas estórias folclóricas que tratam do amor, da mulher morena, do sertanejo, como também cita os desafios do repente e confirma a presença de espírito e a habilidade dos versejadores:

“Interessante são estes improvisadores; mas os desafios prendem-nos mais a atenção. Neste gênero é que o sertanejo se mostra mais senhor de si; revela a sua habilidade, o seu saber, a sua presença de espírito, como se vê”. (p. 75)

Ao tratar dos repentistas, o historiador não os posiciona no espaço do livro dedicado à poesia, mas junto aos cronistas e jornalistas, apesar de reconhecer que estamos diante de hábeis versejadores a ponto de afirmar:

“Têm-se encontrado, igualmente, entre as poesias sertanejas, espécimes outros de versos que escapam as classificações estabelecidas pelos componentes no assunto. São versos em branco, às vezes exóticos, que Marinetti e seus epígonos não poriam, talvez, dúvidas em subscrevê-los” (p. 77).

Assim, o crítico transmite ao leitor uma visão do cânone literário de seu tempo que não aceita a produção oral e que reconhece na literatura apenas a arte das palavras. Na concepção do poeta Rubens de Mendonça, a poesia é fruto do trabalho com o intelecto.

 

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