A poesia mato-grossense na historiografia de Rubens de Mendonça.


Drª Rosana Rodrigues da Silva.

A poesia é fundamental. É escape e é couraça, com a qual se foge ou se engolfa na verdade do destino. É luta e é ternura.É encantamento e é tormento. É espanto diante da vida .É brisa suave, ora é abismo. É o arco e é a flecha. O caos e a lucidez. O aço fino penetrando as fímbrias da consciência ou da loucura. O Poeta é o esteta do sonho”. (Carlos Gomes de Carvalho)
Na História da Literatura mato-grossense, do historiador, crítico e poeta Rubens de Mendonça, temos a apresentação da poesia mato-grossense, ao lado da prosa, abrangendo desde o período colonial até a poesia do século XX. Nesse percurso, o historiador contempla os movimentos romântico, simbolista, parnasiano e modernista, atentando de modo especial à produção poética.
O modo como o poeta Rubens de Mendonça entende e comenta a poesia mato-grossense em sua obra deve diferir do modo como o historiador comum, que não tenha o olhar amalgamado ao do poeta, focaliza e explica essa mesma poesia. É claro que a visão do poeta é sempre mais sensível às nuances do fazer poético e pode levar o analista a entender de modo privilegiado o poema enquanto montado na oficina, ou enquanto evocado no recanto da solidão. O crítico-poeta compreende melhor os bastidores do poema, sempre suspenso e indefinível para aqueles que dele só conhecem o finalmente, a obra pronta.
Da análise desenvolvida diacronicamente por Rubens de Mendonça, e não poderia ser diferente a julgar pela função de historiador, depreendemos aspectos de sua leitura que, se não ajudam na compreensão metodológica do autor, ao menos nos orientam para a definição de um estilo no qual o autor se assenta enquanto historiador e crítico. O estilo, conforme assinala Roland Barthes, em O grau zero da escritura, representa um tipo de linguagem mergulhada no íntimo do autor; não chega a ser o produto de sua escolha ou reflexão sobre a Literatura, mas traduz “as profundezas míticas do escritor e se expande para fora de sua responsabilidade” (2000, p. 11).
Um aspecto desse estilo, ao qual nos deparamos de imediato, são os comentários acerca dos poemas e poetas citados. O crítico traça comentários que vão desde considerações superficiais a outras mais aprofundadas que nos informam detalhes das obras, influência do poeta e outros pareceres da crítica local. Em todo caso, esses comentários denotam o nível da apreciação do autor. Se um poeta é merecedor de uma linha, um outro pode merecer uma ou mais páginas, com maior entusiasmo do crítico. Notamos o humor e ironia na escrita de Rubens de Mendonça que não se intimidou na crítica negativa a autores medíocres ou a pessoas públicas. Sobre o romântico Antônio Gonçalves de Carvalho, por exemplo, o historiador afirmou: “para época foi um bom poeta”. No comentário a um poema do ex-governador do Estado, Jari Gomes, o autor afirma que o soneto transcrito, “formado de palavras retumbantes, não passa de um bestialógico sem pé nem cabeça”.
Em outro momento, ao tratar do poeta Tertuliano Amarilha, autor de Lira Mato-grossense, o historiador cita a crítica de Hélio Serejo que considerou os versos de Tertuliano espontâneos e sinceros, repassados algumas vezes de lirismo ingênuo. A esse comentário, Rubens de Mendonça responde: “eu, porém, os acho apenas ingênuos”.
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