EU, ARAGUAIA E TU

Eu, Araguaia
e tu,
um Tempo só.

Abraamicamente numerosas,
nos garantem o sonho proibido
as estrelas, lá fora canceladas

O ipê batiza ainda com ouros gratuitos
o Silêncio, que nós, ó Araguaia,
conseguimos salvar dos invasores.

Sempre ainda encontramos – eu e tu –
a pergunta inquietante de uma garça, nas beira,
provocando respostas, acordando o Mistério.

... Tu estavas, no princípio,
de acordo com a Lua, sacerdotisa virgem,
alfombrando as cadências do Aruanã sagrado.

Os potes Karajá recolhiam teus olhos
e os peixes costuravam de prata teu banzeiro.

Ainda o Padim Ciço não mostrara
tua Bandeira Verde aos retirantes.

Não havia Funai, Sudam, nem Incra.

Eram
Deus
E as Aldeias.

In: Águas do Tempo

O REINO E O ANTI-REINO

Nas trevas da mentira
a máquina do lucro,
a fome do poder,
os ídolos da Morte.
Diante deles caem
os joelhos incautos.
Eles vêm massacrando
teus anônimos filhos sem defesa.
Seu braço imenso tenta
captura-nos
a todos, Pai da Vida!

Ajuda-nos a abrir
as portas do santuário,
igual que uma consciência,
ao sol, ao mundo,
ao curso do Araguaia.
Entre o luar e a luta
- dos índios e os tori –
como um ventre de História
todo o morro palpita.

Sob as telhas antigas da missão
rompe a luz da Verdade
no estandarte da Páscoa,
e os passos de Francisco,
do Povo e dos romeiros,
se acrescentam ao Passo.
Sem medos, na esperança;
sem deuses, Deus-conosco;
na graça e na conquista
do Teu Reino!


TERRA, ÁGUA, PÃO

Rosto de negro irmão,
feito de sol e dor,
filho da nossa Terra,
massa da nossa massa,
Tu, também,
massa, porém fermento.
Nos falta Pão fraterno,
Jesus de Nazaré!
Nos falta Terra em paz,
Cruz da Aliança!
Nos falta Água viva,
Vida Eterna!

Ainda há muito caos
na Criação ferida.
Há muita Humanidade
definhando de sede.
Fome e sede de Deus
nos queimam, alma adentro,
Carne e Sangue de Deus,
refeição do caminho!

Sacramento do Reino,
Tu nos salva
do pecado e da morte.
Tu nos livra do medo
e do egoísmo.
Tu nos enches de Espírito.
Tu nos fazes Igeja-Sacramento
para a fome da Terra,
para os sede dos Pobres.

In: Murais da Libertação