Rumorosa cascata
de uma nuvem de verão
que se enterra
no jardim
Desta clara torrente
bebem as raízes
minhocas errantes se desnudam
de sua melhor vestidura
Interminável chuva
de lâminas tão finas
sobre pedras
as pedras recusando
a sua posteridade
de torrões de açúcar.

(Lucinda Persona, Por imenso gosto)

Triste

Isto
é dizer que tudo no mundo
é mais ou menos triste
eu compartilho
a melancolia
das coisas comuns e inevitáveis
me fascina
a trilha dos pequenos assuntos.

O infinito é triste (todos já disseram)
e esta síntese mais ainda
mais ainda.

(Lucinda Persona, Sopa escaldante)

O lugar do amor

A qualquer hora
nesta cidade que vibra
ao sol do meio-dia
e me proporciona o conforto de uma casa
e árvores de todos os lados
e o tempo suficiente
para encontrar isto ou aquilo
que proveitoso me seja
Parece que a minha vida
estacionou fora de área
e já sei qual é
o lugar do amor
No trânsito pelo mundo
e para sempre busco a força
que te aumente em minha conta
Quero falar-te boca a boca
(palavras são estrelas
que se movem
na áboboda palatina)
Quero falar-te boca a boca
até ficar em absoluto poder
do ar, materiais, novidades, escuros
que por si comandam teu real
de tão difícil entendimento
quero falar-te
(ou é melhor, não?)

(Lucinda Persona, Leito de acaso)